http://www.jornalpequeno.com.br/2005/4/23/Pagina14209.htm
Ivon de Oliveira Sousa, um empresário piauiense que colecionava com a
mesma dedicação armas e amigos no alto escalão da polícia maranhense, mata um homem com um tiro no rosto, no hotel Central, em 1973, e é morto em 1984, quando estava acompanhado de um delegado
POR OSWALDO VIVIANI
ou de fora), artistas badalados e gente dasocietyludovicence.
Como todo hotel de categoria, o Central abrigava um bar,
localizado no piso térreo. O lugar era um ponto de encontro não só de
hóspedes, mas daquelas pessoas que costumamos chamar de "bem
relacionadas", que faziam do bar uma espécie de "escritório",
onde, geralmente nohappy our(lá pelas 18h), negócios eram realizados
ou desfeitos, tudo regado a muito uísque do bom, e outras bebidinhas fortes,
servidas por garçons das antigas, com gravatas-borboleta e tudo, uma espécie
hoje em franca extinção.
Foi nesse ambiente que no dia 7 de dezembro de 1973, uma
sexta-feira, às 19h30, o empresário e campeão de tiro ao alvo Ivon de
Oliveira Sousa, 36 anos, assassinou com um tiro no rosto o contador do Tribunal
de Contas do Estado José Ribamar Sacramento Pestana Costa, 34.
Disputa por mulher– Uma mulher, que depois se tornaria a
esposa de Ivon, foi o pivô do crime do hotel Central. Seu nome: Hilma Almeida
Viana. Ivon namorava com Hilma há alguns anos e marcara o casamento para o dia
30 de novembro de 1973.
Ao aproximar-se a data do matrimônio, o contador José
Sacramento – um antigo admirador de Hilma, mulher exuberante, que atraía
todas as atenções quando surgia em qualquer ambiente acompanhada de Ivon –,
intensificou suas tentativas de se aproximar da mulher.
Sacramento não se intimidava nem mesmo quando Hilma estava com
Ivon, como em 27 novembro de 1973. Nesse dia, Ivon saía do bar do hotel São
Luís, quando o contador começou a disparar alguns galanteios na direção de
Hilma. Ivon colocou rapidamente a noiva num táxi e, depois de um pequeno
bate-boca com Sacramento, retirou-se. Em 3 de dezembro, três dias depois do
casamento de Ivon e Hilma, Sacramento voltou a abordar Hilma, num momento em que
ela estava só. Já ligeiramente entregue aos efeitos do álcool, o contador
disse à mulher, entre outras coisas, que seu marido "não era de
nada".
De joelhos- Hilma, naturalmente, falou do assédio de
Sacramento ao marido. O clima de confronto iminente estava criado. Na
sexta-feira, 7 de dezembro, Ivon entrou no bar do hotel Central disposto a
acertar as contas com Sacramento. Disse isso, alto e bom som, a várias pessoas.
Era o dia do seu aniversário e Ivon começou a beber mais cedo do que
normalmente fazia.
De acordo com o depoimento de José Batista de Lima, vendedor de
cigarros que trabalhava na porta de entrada do hotel Central, Ivon chegou no bar
aproximadamente às 18h e foi sentar-se junto a alguns colegas. Às 19h15, mais
ou menos, Sacramento entrou no local e foi até o balcão onde trabalhava um
garçom seu amigo, Antonio Cardoso Diniz.
Tão logo viu o rival, segundo o vendedor de cigarros, Ivon
imediatamente levantou-se e foi em sua direção. Ao se encontrarem, Ivon
aplicou uma "gravata" em Sacramento e os dois caíram sobre umas
mesas. Os amigos do Ivon se levantaram e apartaram os dois.
Livre de Ivon, Sacramento correu para os fundos do bar, local
que servia de depósito para caixas de cerveja vazias. Ivon o seguiu, já com
seu revólver calibre 38 em punho. Sacramento ainda tentou se esconder em meio
às caixas de cerveja, mas foi localizado por Ivon. De acordo com testemunhas,
antes de atirar no rosto de Sacramento, Ivon o teria obrigado a se ajoelhar-se.
Sacramento agonizou nos fundos do bar do hotel até ser
transportado numa caminhonete para o Socorrão I, onde morreu. Ivon abandonou o
local num táxi azul, segurando o revólver numa das mãos e algumas balas na
outra.
Absolvido- O delegado
Pedro dos Santos, do 1o Distrito Policial, começou as investigações do caso.
Levantou a ficha de Ivon e descobriu que ele era reincidente em crimes com armas
de fogo: em 1970, respondera inquérito no 1o DP por ter atirado numa das mãos
de Bento Vieira, proprietário de um depósito de cebolas localizado na rua
Henriques Leal. Foi preso em flagrante, mas livrou-se, pagando fiança, por meio
do advogado Daniel Ribeiro da Silva.
Em 11 de dezembro de 1973, foi decretada a prisão preventiva de
Ivon de Oliveira Sousa, pelo juiz da 6a Vara Criminal, José Henrique Campos. Ao
mesmo tempo, familiares de Ivon constituíram como advogados de defesa os
doutores Daniel Ribeiro e José Lago, que conseguiram a revogação da prisão
preventiva, por meio de umhabeas-corpus. Só assim ele voltou do
interior do Estado, para onde havia fugido, e se apresentou à polícia de São
Luís.
Ivon respondeu ao inquérito em liberdade, até ser absolvido
num julgamento acontecido em 1979. Seus advogados alegaram que ele agira sob
violenta emoção, provocada pelo fato de a vítima – José Sacramento –
haver desrespeitado, por diversas vezes, sua mulher.
"Bronca" comprada- Sem mais nada dever à
Justiça, Ivon de Oliveira Sousa casou-se com Hilma e foi morar no Parque
Amazonas (rua Itaituba , quadra Q, casa 12). Seu apego às armas de fogo e um
certo dom natural que possuía de fazer amigos dentro da polícia o levou a
montar uma empresa de segurança – a Master – Maranhão, Segurança
Técnica, Turismo e Representações (rua Oswaldo Cruz, 1305, centro).
Na empresa trabalhavam vários policiais e ex-policiais civis e
militares. Dois dos seguranças da Master – Manoel Inácio Torres e Matias
Meireles Silva –, fiando-se na condição de funcionários de Ivon, um homem
então com muitos amigos no alto escalão da polícia, haviam invadido, em 1978,
um terreno pertencente a Sebastião Monteiro Mendes, um agente de polícia
aposentado.
O terreno ficava na Areinha (rua 48, casa 19, atrás da Comave).
Sebastião morava na parte da frente do terreno. Os dois seguranças de Ivon se
apossaram dos fundos, onde havia duas construções, levantadas por Sebastião,
e passaram a cortar árvores e fazer outras intervenções na área, tudo a
mando de Ivon.
Ivon desde o início assumiu a "bronca" dos
funcionários e passou a entrar em conflito direto com Sebastião Monteiro
Mendes.
Morte na escuridão-
Inúmeras queixas foram registradas, de lado a lado, no 1o DP e na Dops
(Delegacia de Ordem Política e Social), até que no dia 3 de abril de 1984 a
situação alcançou os índices máximos de tensão. Ivon e Sebastião
estiveram, nesse dia, à tarde, na Secretaria de Segurança, onde conversaram
com os delegados Pedro Gonçalves e Luís Moura (hoje preso por envolvimento no
crime organizado) . Cada um expôs sua versão, mas não chegaram a um acordo.
Logo após a conversa, Sebastião saiu do distrito num táxi, e
Ivon pediu para que o delegado Lenine Pontes o acompanhasse ao terreno da
discórdia, a fim de que o policial averiguasse a situaçãoin loco.
Rumaram para o local na caminhonete Ford F-1000 de Ivon, conduzida pelo
motorista da polícia João Batista Cardoso, mais conhecido como
"Macarrão".
Chegando ao terreno, na Areinha, Ivon começou a mostrar a área
ao delegado Lenine. Preocupado, já que o lugar estava em completa escuridão, o
delegado chamou a atenção de Ivon para o fato de estarem muito expostos ali e
que estava desarmado. "Eu pressenti a morte", diria, depois, o
policial.
Ivon brincou: "Que é isso compadre? Estás ficando
medroso? Estou lhe desconhecendo". Em seguida, prometeu que em alguns dias,
presentearia Lenine com uma arma.
Nem bem Ivon acabou de dizer isso, veio o disparo. Uma carga de
chumbo, que o atingiu em cheio no peito. "Ao ser alvejado, ele estava com a
mão em meu ombro, e pediu para que eu o ajudasse.
Apavorado, pois havia escapado por pouco, nada pude fazer, a
não ser colocá-lo no carro, com a ajuda de ‘Macarrão’, e levá-lo para o
Hospital Português, onde ele ainda chegou com vida, falecendo instantes
depois", contou Lenine Pontes.
Um vizinho– Antonio Carlos Diniz –, que se
encontrava nas imediações, informou à polícia que viu Sebastião e seu filho
José Ribamar Costa Mendes fugirem num táxi Fiat verde. José Ribamar carregava
uma espingarda do tipo cartucheira.
No dia 25 de abril, o ex-agente da polícia civil
Sebastião Monteiro Mendes, 53 anos, se apresentou no 1o DP, acompanhado de seu
advogado Carlos Alberto Figueiredo. Admitiu que matou Ivon porque estava sendo
ameaçado, e garantiu que seu filho José Ribamar (empacotador do Supermercado
Confiança, da rua Grande) não tinha nada a ver com o crime. "Matei para
não morrer. Fui ameaçado de morte pelo Ivon na frente do delegado Luís
Moura", declarou Sebastião.
A Justiça foi tão condescendente com Sebastião como fora com
Ivon no caso do crime do hotel Central. Ele foi absolvido cerca de quatro anos
depois de cometer o assassinato.
Ivon de Oliveira Sousa, morto aos 47 anos, foi enterrado no dia
4 de abril de 1984 em Teresina (PI), sua cidade natal. Deixou mulher, dois
filhos e uma vasto rol de amizades entre os policiais maranhenses.
Alguns desses antigos "colaboradores" entraram na casa
do empresário, no Parque Amazonas, dias depois de seu assassinato, e levaram
todas as armas de sua extensa coleção. Alegaram que as mesmas "não
estavam registradas".
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