terça-feira, 30 de abril de 2013

MPF denuncia Ustra e delegado por ocultação de cadáver

Denúncia foi encaminhada à Justiça Federal na segunda-feira (29).
Restos mortais de estudante de medicina seguem desaparecidos desde 72.



O coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-comandante do DOI-Codi de São Paulo, e o delegado aposentado Alcides Singillo, que atuou junto ao Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo (Deops-SP), foram denunciados pelo Ministério Público Federal de São Paulo (MPF–SP) por ocultação de cadáver no período da ditadura militar. A denúncia foi encaminhada à Justiça Federal nesta segunda-feira (29). De acordo com o MPF-SP, os restos mortais do estudante de medicina Hirohaki Torigoe, de 27 anos, estão desaparecidos desde 5 de janeiro de 1972.
A defesa de Ustra disse ao G1 não haver provas contra o coronel. Os advogados de Singillo não foram localizados até o final desta manhã para comentar a acusação contra o delegado.
Ustra foi comandante do Destacamento de Operações Internas de São Paulo (DOI-Codi-SP) no período de 1970 a 1974. De acordo com o MPF, essa é a terceira denúncia protocolada contra ele. Já Singillo era, na época, delegado do Deops de São Paulo. A ação, que foi ajuizada na sexta-feira (27), é a primeira pelo crime de ocultação de cadáver, segundo o MPF. As ações anteriores tratavam de crimes de sequestro supostamente cometidos por agentes do regime.
A denúncia aponta que Hirohaki Torigoe não foi morto na Rua Albuquerque Lins, em Santa Cecília, como consta na requisição de laudo necroscópico, mas foi levado com vida ao DOI-CodiI do II Exército, onde foi torturado antes de morrer. A afirmação se dá com base em depoimentos de duas testemunhas que estavam no local. Segundo o MPF, “a vítima não foi morta imediatamente após tiroteio com agentes da repressão política”.
Hirohaki Torigoe era estudante da Faculdade de Medicina da Santa Casa, integrante do Movimento de Libertação Popular (Molipo) e foi morto aos 27 anos. Segundo a denúncia, ao todo 15 integrantes do grupo teriam sido mortos quando estavam em poder do Estado, entre novembro de 1971 e outubro de 1972.
Ainda segundo o que aponta o MPF-SP, os documentos de identificação desses cadáveres foram falsificados. Em São Paulo, o procedimento teria sido adotado com pelo menos nove integrantes de outras organizações, que foram enterrados com nomes falsos ou como desconhecidos. A localização exata dos locais de sepultamente também não consta nas certidões de óbito lavradas com os nomes falsos. Os corpos foram sepultados nos cemitérios de Perus e Vila Formosa, para dificultar ou impedir futuras localizações.
Apesar dos registros falsos, as identidades das vítimas eram amplamente conhecidas pelas autoridades envolvidas nas mortes, segundo o MInistério Público. Na denúncia, consta que os agentes responsáveis pela prisão de Torigoe tinham, desde o princípio, conhecimento da verdadeira identidade do detido. Ainda assim, os documentos a respeito da morte da vítima, inclusive o laudo necroscópico, a certidão de óbito e o registro no cemitério, foram elaborados em nome de “Massahiro Nakamura”. De acordo com a denúncia, a prova de que a identidade de Torigoe era conhecida consta no Arquivo Público do Estado, que armazena 1.293 páginas de documentos pertencentes ao DEOPS, relacionados à vítima.
Na ação proposta pelo MPF, Ustra é acusado de sepultar clandestinamente o cadáver de Hirohaki Torigoe, falsificar os documentos do óbito para dificultar a localização do corpo, ordenar a seus subordinados que negassem aos pais da vítima informações a respeito de seu paradeiro, e retardar a divulgação da morte. Já o delegado de polícia aposentado Alcides Singillo é acusado de deixar de comunicar a correta identificação e localização do corpo à família da vítima, ao cemitério onde ele supostamente foi sepultado e ao cartório de registro civil onde o óbito foi registrado.
O advogado de defesa de Carlos Alberto Brilhante Ustra, Paulo Alves Esteves, acredita que a denúncia não será aceita por falta de provas. "O argumento é semelhante ao caso do sequestro, em que a denúncia não foi aceita. Não há provas. Não é possível dizer que houve ocultação de cadáver se não há provas do corpo em si e nem do local em que ele supostamente teria sido ocultado", disse ao G1. Já Alcides Singillo não foi localizado pela reportagem.
Além do crime denunciado nesta ação, o MPF apura as circunstâncias do desaparecimento doloso dos corpos de outras vítimas mortas em São Paulo durante a ditadura militar e sepultadas com identidades falsas em valas clandestinas nos cemitérios de Perus e Vila Formosa. De acordo com o MPF, apesar de diversas tentativas de localização dos restos mortais do estudante Hirohaki Torigoe, estes permanecem desaparecidos até hoje.

Nenhum comentário:

Postar um comentário