O Blog recupera uma série de reportagens do jornal pequeno
intitulada" assasinatos que abalaram S.Luís".
a primeira reportagem é sobre o assasintode Johnn kennedy, execitivo da Ulen , empresa Americana no Maranhão no setor de energia. O caso teve grande repercussão e intervenção dadiplomacia Americana no Brasil,
O Brasil dos anos 30 era um país conturbado.
Logo no início da década, a chamada Revolução de 1930, movimento empreendido
por políticos e militares, derrubara o então presidente Washington Luís,
estabelecendo o fim da República Velha e inaugurando a chamada Era de Vargas,
que instalaria o gaúcho Getúlio Dorneles Vargas no poder por um período de
quinze anos.
A "revolução vitoriosa", no entanto, não teve
"cacife" para deter a ação predatória do capital estrangeiro no
Brasil, que já se transformara num dos países detentores dos números mais
expressivos da dívida externa.
Assim, mesmo sob a égide do getulismo, os dólares e as libras
esterlinas falaram mais alto, e empresas inglesas e norte-americanas,
continuaram a auferir lucros escorchantes e a prestar péssimos serviços à
população em setores importantes, como águas e esgotos, energia elétrica,
transportes e industria de confecção.
O Maranhão não escapou ao apetite leonino das corporações
internacionais. Desde 1923, os serviços de tração elétrica (bondes), luz,
águas e esgotos e prensa de algodão eram explorados pela norte-americana Ulen
Company.
Nos primeiros anos da década de 30, a indignação e a revolta
da população – sufocada por taxas e impostos extorsivos – contra a Ulen
já atingia índices altíssimos. O governo maranhense também não suportava
mais ter de cumprir rigorosamente as cláusulas do contrato, que faziam sangrar
dos cofres públicos mais de um terço da receita pública, com o pagamento
periódico de altos juros.
Num telegrama ao presidente Getúlio Vargas, em 1933, o
governador do Maranhão, Antônio Martins de Almeida, escreveu: "O contrato
com a Ulen é um atentado à dignidade e à soberania de um povo".
Para muitos estudiosos da história maranhense, é impossível
que esse clima de revolta contra os desmandos da Ulen Company não tenha
envenenado a mente do bilheteiro de bonde José de Ribamar Mendonça, quando
ele, inconformado com sua demissão, depois de quase dez anos de trabalho,
decidiu, no dia 30 de setembro de 1933, assassinar o contador da Ulen, John
Harold Kennedy.
"Parecia um macaco!"
- A sede da Ulen ficava na
esquina da rua da Estrela com a rua Direita (Henrique Leal), onde hoje está
localizada a Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão do Estado.
O escritório era chefiado por Harry Isler, e tinha como segundo
homem na hierarquia John Harold Kennedy, responsável por toda a parte contábil
da empresa. John Harold era tio de John Fitzgerald Kennedy, que se tornaria
presidente dos Estados Unidos em 1961 e morreria assassinado em novembro de
1963.
Desde a instalação da Ulen em São Luís, em 1923,
multiplicaram-se na cidade episódios que revelavam a arrogância, o preconceito
e o desprezo de seus funcionários em relação à população ludovicence.
Os trabalhadores brasileiros da companhia eram as principais
vítimas do tratamento humilhante dos ianques. Mas os maus-tratos e as atitudes
prepotentes não se limitavam às dependências do escritório da Ulen. Quando
saíam às ruas para "se divertir", os "gringos" promoviam
quebra-quebras homéricos nos bares e arruaças diversas.
O mau exemplo vinha de cima. Era mais que conhecido do povo de
São Luís o comportamento de Anne Isler, mulher do chefão da Ulen, que
aterrorizava os populares quando resolvia ziguezaguear pelas ruas da cidade com
seu carrão, à velocidade máxima – na época, uns 100 quilômetros por hora.
Além dos carros velozes, Anne nutria outra paixão: a caça. E
não só de animais. Certa feita, caçando nas matas do Sacavém – onde,
aliás, a prática desse esporte era proibida –, desfechou, com sua Winchester
de dois canos, vários tiros num vulto que apareceu, de repente, por detrás de
uma árvore. A "presa" era um guarda florestal, que teve morte
instantânea.
Na delegacia, questionada por um policial, Anne Isler declarou,
displicentemente: "Really, he was looking like a monkey!"
("Realmente, ele parecia com um macaco!").
O contador John Harold Kennedy não era menos petulante e
grosseiro. Era ele quem cuidava da contratação e demissão dos funcionários
brasileiros da Ulen, a quem tratava com modos rudes – tratamento do qual não
escapavam nem mesmo aqueles que estavam na empresa desde o início, como era o
caso do bilheteiro de bonde José de Ribamar Mendonça.
Nas suas horas ociosas, Kennedy cultivara o hábito de
freqüentar o bordel de Laulita, na rua da Palma, onde gastava uma boa
quantidade de dólares bebendo uísque House, fumando cigarros Look-Strike e,
naturalmente, comprando sexo.
Entre as moças de Laulita, sua predileta era Lurdinha, de quem
provavelmente contraiu a blenorragia (doença venérea popularmente conhecida
como gonorréia) diagnosticada pelo doutor José Murta, que tinha consultório
à praça João Lisboa, 190.
Umas doses de tiquira
- José de Ribamar Mendonça, ao
contrário dos endinheirados americanos da Ulen, era um jovem humilde e de
hábitos simples. Nascido em Cajapió (Baixada Maranhense) em 1908, criou-se no
campo, onde desde cedo aprendeu a cumprir suas tarefas com responsabilidade,
ordenhando vacas e levando os animais para o pasto. Em 1924, aos 16 anos, veio a
São Luís e, disposto a ajudar a família, empregou-se na Ulen.
Depois do expediente, Ribamar gostava de bebericar umas doses de
tiquira no botequim do Zé Sampaio, que ficava ali bem perto do escritório da
Ulen. Depois, antes de ir para casa, no Beco do Couto, costumava dar um passeio
pela praça Benedito Leite, fumando cigarros da marca Fidalgo, a mais popular da
época.
Foi numa dessas caminhadas notívagas na praça que Ribamar
encontrou sua amada, Ita, uma graciosa adolescente de 16 anos que morava onde
hoje é o Canto da Fabril.
Quando já estava perto de completar 10 anos de empresa – o
que lhe garantiria, por lei, a estabilidade no emprego – Ribamar, então com
25 anos, pensou seriamente em constituir uma família com Ita. Os dois não
tiveram nem tempo de sonhar. A demissão de Ribamar – sem qualquer motivo que
a justificasse, já que era um funcionário aplicado –, na manhã do dia 30 de
setembro de 1933, fez cair por terra todos os planos do casal de concretizar uma
vida em comum de felicidade.
Sem arrependimento
- Depois da demissão, Ribamar ainda
tentou procurar alguns políticos influentes para tentar reverter a decisão.
Uma das pessoas que contatou foi o ex-governador Astolfo Serra. De nada
adiantou. Os diretores da Ulen se mantiveram irredutíveis.
No dia 30 de setembro de 1933, o homem que se apresentou, às
17h30, no escritório da Ulen, pedindo para falar com o contador John Harold
Kennedy era uma pessoa em desespero.
Um jovem maranhense de 16 anos, Alberto Champadry, atendeu
Ribamar, indo chamar John Harold, que estava reunido com o chefe da seção de
águas, Ghete Jansen.
Ribamar esperou impassível, de pé, junto à grade que separava
a sala de espera do escritório propriamente dito. Depois de alguns minutos,
John Harold veio até Ribamar.
Os dois trocaram umas poucas palavras e o norte-americano
virou-se para voltar à reunião com Ghete Jansen. Nesse momento, o bilheteiro
demissionário sacou um revólver marca OV, niquelado, cano longo, calibre 32, e
desferiu quatro tiros na direção de John Harold. Só dois acertaram o
norte-americano, mas foram fatais.
Perpetrado o crime, Ribamar, ainda com o revólver na mão,
correu em direção à rua Afonso Pena, perseguido por uma pequena multidão.
Chegando ao Departamento de Saúde e Assistência, entrou no prédio, sendo
perseguido pelo cabo da Força Pública, José Caetano da Silva.
Quando o cabo o alcançou, Ribamar conversava com o médico
Ático Seabra. Ao ver o policial, Ribamar, calmamente, entregou-lhe a arma e
disse: "Matei agora mesmo o bandido que mais me perseguia, mas não estou
arrependido".
Pressão ianque
- O assassinato de um dos principais
executivos da Ulen teve grande repercussão. Jornais do Maranhão (A Pacotilha),
do sul do país (Jornal do Comércio, O Globo, ambos do Rio de Janeiro) e até
dos Estados Unidos (The New York Times) deram grande destaque ao assunto.
Preso, José de Ribamar Mendonça foi julgado quase
sumariamente, no mesmo ano de 1933. O julgamento, como não poderia deixar de
ser, teve como pano de fundo a exploração do país pelas grandes empresas
internacionais.
O governo norte-americano pressionou de todas as formas
possíveis a Justiça brasileira para obter a condenação de Ribamar.
Subserviente, o próprio Itamaraty, para não desagradar os "irmãos do
norte" e manter abertas as torneiras que periodicamente desaguavam milhares
de dólares no país, também se empenhou pela condenação do réu.
Apesar de todas as pressões, José de Ribamar Mendonça foi
absolvido em dois julgamentos (o primeiro, por 5 a 2; o segundo, por
unanimidade), graças principalmente à atuação do advogado Waldemar de Brito,
um dos maiores criminalistas de sua época.
Sem emprego e sem amor – a bela Ita se afastou, em meio ao
turbilhão desencadeado pelo crime –, Ribamar partiu para o Rio de Janeiro,
onde conseguiu um emprego como cobrador, na empresa Atlantic.
Estava claro que José de Ribamar queria se livrar do pesadelo
chamado Ulen, começar vida nova, esquecer de tudo. Mas o implacável
"polvo" norte-americano não o esqueceu. Em 19 de janeiro de 1944,
mais de dez anos depois do crime, ele foi novamente preso, dentro da própria
Atlantic, como resultado de um conluio entre o Itamaraty e a Embaixada
Americana.
Transferido do Rio para São Luís, Ribamar sequer chegou a ser
julgado: Waldemar de Brito o livrou definitivamente com um habeas-corpus, em 29
de maio de 1944.
Dez dias depois, Ribamar embarcava de volta ao Rio e ao seu
emprego na Atlantic. Lá, o assassino de John Kennedy ficou até morrer,
fulminado por um ataque cardíaco, em 22 de março de 1952, aos 44 anos
Fonte: Jornal pequeno
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