O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu anular, por unanimidade (11 votos a zero), parte do processo do mensalão referente ao réu Carlos Quaglia, acusado pelo Ministério Público de lavar dinheiro repassado das agências de Marcos Valério e que teria sido utilizado para compra de votos de parlamentares do PP.
A corte entendeu que houve cerceamento ao direito de defesa do réu, cujos advogados deixaram de ser intimados por mais de três anos.
Os ministros decidiram pelo desmembramento do processo para que Quaglia continue a responder ao processo na primeira instância - ele deve responder na Justiça Federal de Santa Catarina, onde reside. Com isso, somente 37 réus serão julgados no Supremo pelo suposto esquema de compra de votos no Congresso denunciado pela Procuradoria Geral da República.
Na última sexta-feira (10), o defensor público-geral da União, Haman Tabosa de Moraes e Córdova, pediu no púlpito do STF que o processo contra Quaglia fosse anulado desde o interrogatório do réu por uma “falha” do Supremo.
Segundo Córdova, por mais de três anos as intimações referentes ao processo foram direcionadas para o advogado que não representava mais o réu. Quaglia, que responde por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro, alegou não ter dinheiro para pagar advogado particular e foi o único defendido pela Defensoria Pública.
O defensor público-geral pediu a nulidade dos atos do processo relativos a Quaglia realizados entre janeiro de 2008 e abril de 2011 para que o réu passe a responder ao processo novamente a partir do interrogatório à Justiça.
Voltou atrás
O relator da ação penal, ministro Joaquim Barbosa, inicialmente votou contra o pedido, mas depois voltou atrás e mudou o voto.
Para Barbosa, houve “má fé” do réu ao alegar cerceamento do direito de defesa.
“Não há como negar a má fé do réu Carlos Alberto Quaglia. Ele apresentou defesa prévia, com indicação de testemunhas e alegações finais. Não houve cerceamento da defesa. Parece um caso presente em que o torpe tenta aproveitar-se da própria torpeza”, disse Barbosa.
Em sua argumentação, Joaquim relatou que Quaglia entregou procuração em 9 de julho de 2006 dando poderes aos advogados Dagoberto Dufau e Elaine Cristina. O ministro afirmou que Dagoberto Dufau só renunciou oficialmente à defesa de Quaglia em 2010. Barbosa afirmou que o réu foi pessoalmente intimado a constituir novo advogado, com a advertência de que, se não o fizesse, passaria a ser representado por um defensor público nomeado pelo Judiciário.
“Como se vê, Carlos Alberto Quaglia não disse a verdade ao dizer que não conhecia o advogado e não tinha feito procuração. Não informou a esta corte que o advogado Dagoberto não seria seu defensor, somente o fazendo ao final de um interrogatório em 2008, em Santa Catarina. Foi pessoalmente intimado a constituir advogado. Foi pessoalmente informado da renúncia dos advogados Dagoberto e Elaine Cristina. Permaneceu silente”, resumiu o relator.
O ministro-revisor do processo, Ricardo Lewandowsky, discordou, então, do relator e votou pela nulidade da fase de instrução – coleta de provas, depoimentos de testemunhas e interrogatório dos réus. O ministro afirmou que procuração dando poderes ao Dagoberto Dufau foi tacitamente revogada por nova procuração que dava poderes ao advogado Haroldo Rodrigues.
O ministro também citou que quatro testemunhas arroladas pela defesa do réu não foram ouvidas, o que considerou uma questão “muito séria”. “Assim, entendo que ocorreu nulidade absoluta. Esse cerceamento causou prejuízo insanável ao réu. [Não teve] o direito de exercer plenamente o contraditório.”
‘Má fé’Lewandowski afirmou que não é possível dizer que houve "má fé" por parte da Defensoria Pública, que representou Quaglia na sustentação oral. "Dizer que a Defensoria agiu de má fé? Nunca vimos isto no tribunal", afirmou.
Joaquim Barbosa, então, reconheceu que a defesa deixou de ser notificada, mas sustentou que, em sua avaliação, houve “má fé”. “Eu vejo, sim, má fé”, disse.
“Má fé encampada pela Defensoria? Eu acho muito difícil”, rebateu Lewandowsky.
Análise de preliminarOutras 17 preliminares (questionamentos da defesa dos réus) foram rejeitadas pelo plenário do Supremo.
Entre elas, pedidos para que o processo contra réus sem foro privilegiado fosse enviado para a primeira instância, impedimento do relator por falta de parcialidade, inclusão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na ação penal, além de requerimento para anular perícias, depoimentos de testemunhas, entre outras.
Na análise da penúltima preliminar, o relator Joaquim Barbosa chegou a afirmar que pretendia “eliminar abobrinhas”, referindo-se à análise de alguns pedidos dos advogados de defesa. No momento em que o magistrado fez a declaração, advogados gritaram no plenário.
Nenhum comentário:
Postar um comentário