domingo, 10 de junho de 2012

“Virtuosa tem de ser a instituição, não a pessoa”

“Virtuosa tem de ser a instituição, não a pessoa”


Para o ex-ministro Márcio Thomaz Bastos quando o assunto é aperfeiçoamento da democracia e consolidação de valores civilizatórios, não há atalho, não há saltos evolutivos.Trata-se de um processo longo e gradual que depende mais da consolidação de valores sociais e amadurecimento das instituições do que de virtudes individuais.
“È um processo, as coisas não dão saltos. Concordo com a ideia de Montesquieu que postula que a sociedade não se controi sobre a virtude dos homens, mas sobre a força de suas intituições”, disse Thomaz Bastos, citando o filósofo francês do século 18. O ex-ministro é advogado de José Roberto Salgado, ex-vice presidente do Banco Rural, no processo do mensalão, e defende também Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.
Em entrevista ao programa Ponto a Ponto, da emissora de TV por assinatura BandNews, que foi ao ao ar no sábado à noite (8/6), etem reprise às 20h30 deste domingo (10/6), o advogado falou sobre o que definiu como “sede por justiçamento da opinião pública” e a sofisticação do regime democrático.
Falando à jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, e ao cientista social Antonio Lavareda, Thomaz Bastos disse que é necessário termos consciência que é imprescindível dispormos de uma Polícia que investigue, um Ministério Público que acuse, um Judiciário que julgue e um sistema penitenciário que, pelo menos “ não alimente a reinscidência”. Mas que não se pode pensar que atropelar esse processo irá nos conduzir a um maior rigor na correção de maus hábitos e no aperfeiçoamento da democracia e da Justiça.
Depois de assistir a uma reportagem, veiculada no programa, que informou que 7 em cada 10 brasileiros são interessados em política, ao contrário da alienação endêmica apregoada pelo senso comum, Thomaz Bastos observou que há uma distorção provocada pelo fato de, no Brasil a corrupção estar mais exposta e ser combatida do que jamais foi.
“Vamos chegar a um ponto em que a democracia, por sua própria, prática vai resolver isso”, disse. “Lembremos que, no início do século passado, na Câmara dos Comuns, no Reino Unido, havia um guichê onde os parlamentares recebiam o dinheiro, uma espécie de mensalão da época. [A depuração gradual de costumes] não impediu que a Inglaterra se tornasse um país altamente democratizado. Isso dá a esperança de que, pela reiteração dos usos, possamos encontrar isso, um outro patamar de regime democrático”, avaliou.
Sobre o aperfeiçoamento das práticas investigativas em contraponto às operações pirotécnicas promovidas por autoridades policiais, o advogado lembrou que o processo de aprimoramento não está livre de “imaturidades”. “A Polícia Federal precisa de tempo. Essa instituições, quando sobem de nível, passam a um novo paradigma, precisam passar pela infância e a adolescência. Muitas vezes, são acometidas por doenças“doença infantil, como uma ‘cachumba’. [Isso] é expresso na vontade de vazar documentos, por exemplo”, disse o ex-ministro. “Mas existem mecanismos para coibir isso. Essas coisas vão desaparecer pois terão de ser trabalhadas em um nível de civilização, numa perspectiva de amadurecimento”.
Márcio Thomaz Bastos observou, contudo, que a Polícia Federal vive um período de sofisticação e refinamento de suas práticas, vivendo um intenso processo de amadurecimento e transição. Provocado pelo sociólogo Antonio Lavareda, que disse que o sistema político brasileiro compreende quatro vícios graves (o sistema proporcional de lista aberta, coligações nas eleições proporcionais, ligações ad hoc e a falta da cláusula de barreira), o ex-ministro da Justiça ponderou que a reforma política, embora seja importante, na sua visão, não é imprescindível. “A reforma política não é tão fundamental. Tenho muitas dúvidas sobre voto distrital e lista fechada. No mundo inteiro existe essa discussão, não há um modelo claro”, falou.
O entrevistado ainda ponderou que o aprimoramento das instituições e a correção de maus hábitos é fruto dos tempos e que os valores seguem uma lógica histórica. “Quando comecei a advogar, o imposto de renda era facultativo, pois não havia sanção, não havia repressão. Depois, a Receita criou todo um programa, inclusive de jogar símbolos sobre o cidadão, como o ‘leão’, e todos se viram na obrigação de pagar”, disse. “Os hábitos se refinam. Molhar a mão do corretor, por fora, na compra de um imóvel era muito comum até há pouco tempo. Hoje é cada vez menos frequente”.
Opinião pública e publicada
Questionado pela jornalista Mônica Bergamo sobre o fato de defender políticos acusados de corrupção, sobretudo no processo do mensalão, Márcio Thomaz Bastou disse que a liberdade de imprensa compreende até mesmo a crítica à imprensa . “A grande imprensa tomou partido, elevou tudo a um ponto simbólico muito forte”, disse se referindo ao caso do mensalão. Mesmo integrando um valor constitucional da mais alta nobreza, a imprensa não está livre de sofrer críticas”, disse.
O ministro lembrou de casos paradigmáticos onde a opinião pública atropelou o devido processo penal, como no caso Richtofen, quando a estudante acusada de matar os próprios pais foi julgada em meio ao clamor público por punição.
“Já estive de ambos os lados. Já defendi causas que em tive a opinião pública – e publicada – a meu favor. É uma delícia. Mas já enfrentei a maré, estando absolutamente na minoria, o único a segurar a mão do réu no fim da escada, crucificado e contra o vento ”, rememorou.
Lembrando Nelson Hungria, o entrevistado classificou como “publicidade opressiva”, o papel da mídia em casos como Richtofen, Nardoni e mesmo o caso do assassinato da atriz Daniela Perez em 1992.
“ A vigilância da imprensa é fundamental, mas às vezes, ela erra”, disse. “É uma máquina que empurra a todos, como uma tragédia grega, em que tudo já aconteceu, cabendo assim a encenação, quando chancela o veredito definido lá atrás”, declarou.

Fonte: conjur

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