sábado, 23 de novembro de 2013

Dona Ana Joaquina Jansen Pereira e seu nascimento



28 de janeiro de 2012

João Dias Rezende Filho*
Dona Ana Joaquina Jansen Pereira, Ana Jansen, Don’Ana Jansen, Nhá Jansen, Nhá Jansa ou, simplesmente, Donana era filha do senhor Vicente Gomes de Lemos Albuquerque e de Dona Rosa Maria Jansen Moller (ou Müller, como mais tarde veio a grafar-se o nome). Bisneta materna de Henrique Jansen Moller, descendente de antigas famílias holandesas, portuguesas e italianas e neta do Mestre de Campo Theodoro Jansen Moller, Dona Ana Jansen não nasceu, ao que parece, em uma “boa fase” nas finanças de sua família, entretanto, a sorte iria sorrir-lhe.

Um relacionamento amoroso com o abastado fazendeiro, o Coronel Isidoro Rodrigues Pereira, que era casado, mas que mais tarde, já viúvo, veio a casar-se com a jovem Ana Jansen, deu-lhe, novamente, o status que, por infortúnios comerciais, tinham perdido os Jansen. Tornou-se, Donana Jansen, economicamente poderosa e politicamente muito influente, fato raro na sociedade da época em que as mulheres não eram relevantes em assuntos econômicos e, menos ainda, políticos. Cedo enviuvando do Cel. Isidoro Pereira, torna-se senhora de todo patrimônio herdado do marido e uma das cabeças do partido liberal, os chamados Bem-te-vis.

Ana Jansen foi, assim, uma figura polêmica que criava dissabores para muitos políticos, sobretudo para os conservadores, como seu arqui-rival, o ilustrado gramático, latinista e professor do Liceu, Francisco Sotero dos Reis. Misto de lenda e realidade, a vida de Donana Jansen, até hoje, desperta grande interesse. Deve-se ter o cuidado de não julgá-la fora de sua época, utilizando medidas e parâmetros alheios ao sitz im leben, isto é, ao contexto vital em que a personagem viveu e atuou. Muitas das atrocidades imputadas à personagem resultam da difamação dos seus opositores políticos ou, quando verdadeiras, do que não se duvida, não diferia, substancialmente, do comportamento dos demais senhores e senhoras de escravos (vide o exemplo do célebre crime cometido pela futura baronesa de Grajaú que, tresloucadamente, assassina dois escravinhos seus a garfadas).

Diante de tão fascinante personagem, fonte de tantas paixões e debates acalourados, resolvi, incentivado pelo genealogista Roberto Menezes de Moraes, iniciar uma pesquisa sobre Ana Jansen, sua família e sua história. Nada melhor para começar que pelo nascimento de Donana.

Não há um dia, mês e ano precisos para o nascimento de Ana Jansen. Somente o ano 1787 é tido como o ano em que a ilustre personagem veio ao mundo. A data abonada por muitos pesquisadores, como, por exemplo, o acadêmico Jomar Moraes em Ana Jansen, Rainha do Maranhão que, no início da obra, no capítulo ironicamente intitulado “A rainha que não chegou a baronesa” fazendo referência ao tão almejado baronato que nunca lhe foi concedido, apesar das inúmeras tentativas de Ana Jansen em convencer o Imperador, desde as simples adulações até as centenas de arrobas de mantimentos e provisões (arroz, feijão etc.) enviadas para os soldados brasileiros em campanha no Paraguai, pois bem, como dizia, neste capítulo, à página 13, diz-nos Jomar Moraes que Ana Jansen “nasceu em São Luís, no ano de 1787, e faleceu na mesma cidade, a 11 de abril de 1869, contando 82 anos de idade”. O ano de 1787 é repetido, anteriormente, em obras do eminente historiador Jerônimo de Viveiros e, igualmente, pelo pesquisador Waldemar Santos em sua obra Perfil de Ana Jansen. Esta data, porém, nos cria uma série de dificuldades, para não dizer aporias. Partindo da data de falecimento, contida no Jornal O Publicador Maranhense, de 12 de abril de 1889, em que Ana Jansen teria falecido aos 82 anos de vida no dia 11 de abril de 1869, ela teria nascido em 1787. A data de falecimento está correta, mas a de nascimento, como já disse, cria-nos embaraços, senão, vejamos: seu último filho, nascido entre a viuvez do primeiro matrimônio, com o Coronel Isidoro Pereira e o seu segundo matrimônio com o Comerciante Antônio Xavier da Silva Leite, fruto de seu relacionamento com o desembargador Francisco Carneiro Pinto Vieira de Mello, foi batizado na Freguesia de Nossa Senhora da Vitória (Sé), em São Luís no dia 28 de julho de 1838, tendo nascido, segundo consta no texto do próprio assento, em 15 de maio daquele mesmo ano de 1838. Considerando que Ana Jansen tivesse nascido, realmente, em 1787, teria àquela altura a improvável idade de 51 anos, isto é, um pouco idosa, para conceber, visto que, em geral, aos 51 anos as mulheres já não estão em período fértil, além do que, a medicina da época não permitia, ao nosso ver, um adiamento da menopausa ou, na hipótese de uma menopausa naturalmente tardia, uma gravidez de risco chegada a termo com mãe e filho sãos e salvos não era algo factível. Outra dificuldade que se coloca diz respeito à data de casamento dos pais de Ana Jansen que se uniram em São Luís, em 27 de julho de 1792. Parece-nos pouco provável que, Ana Joaquina tivesse nascido antes do matrimônio de seus pais.

O verdadeiro ano de nascimento de Ana Jansen pode ser deduzido a partir de um documento encontrado no acervo da Arquidiocese de São Luís, sob a guarda do Arquivo Público do Estado do Maranhão. Ana Jansen nasceu, segundo seu próprio testemunho, em 1798, isto porque em um processo de justificação de batismo datado de 1832 de um sobrinho da matrona, o senhor José Jansen do Paço, Ana Joaquina Jansen Pereira é arrolada como testemunha e, em seu depoimento, ela diz ter a idade de 34 anos. Basta-nos, pois, um simples cálculo e teremos como resultado o ano de 1798 (1832-34=1798).

Alguém poderia objetar que Ana Jansen Pereira poderia ter mentido ou alterado sua idade. Parece muito pouco provável esta hipótese, senão impossível, visto que, naquela época um processo de justificação de batismo era algo muito sério e meticuloso, além do que, toda oitiva de testemunhas, mormente em um processo de natureza eclesiástico-canônica, era tomada sob juramento diante dos livros dos Santos Evangelhos, o que impunha muito temor às pessoas de cometerem não somente o crime de perjúrio, mas de, mentindo diante do próprio Deus, ser condenadas às penas infernais. Assim, pelos motivos expostos e pelas provas documentais, fica esclarecido o ano exato do nascimento da matrona maranhense e, com esta pequena descoberta, que se quis logo tornar pública, corrige-se um equívoco histórico cometido por historiadores e intelectuais maranhenses que, no que pesem a qualidade de seus trabalhos, não tiveram acesso às fontes primárias que se teve e ressentem-se deste senão. Quanto ao restante da data, isto é, o dia e o mês exatos do nascimento, mesmo compulsando-se boa parte dos livros de batismos do período de 1798, ainda não foi possível encontrar-se o assento de batismo de Ana Jansen, que preencheria, definitivamente, a lacuna.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

Fontes Primárias:

Processo de Justificação de Batismo de José Jansen do Paço de 11 de agosto de 1832. Lista nominal 24 de Documentos avulsos do acervo da Arquidiocese de São Luís do Maranhão sob a guarda do Arquivo Público do Maranhão.

Assento de Batismo de Luís Venâncio no Livro de Batismo da Freguesia de Nossa Senhora da Vitória (Sé) Livro 121 do acervo Arquidiocese de São Luís do Maranhão sob a guarda do Arquivo Público do Maranhão.

Assento de casamento de Vicente Gomes de Lemos Albuquerque e Rosa Maria Jansen Moller- Livro de casamento 88 do acervo Arquidiocese de São Luís do Maranhão sob a guarda do Arquivo Público do Maranhão.

Livros:

ABRANCHES, Dunshee de. O Cativeiro. 2 ed. São Luís: Edições AML , Série Documentos Maranhenses, 1992.

MORAES, Jomar. Ana Jansen, Rainha do Maranhão, 2 ed. São Luís: Edições AML, Série Documentos Maranhenses vol.18, 1999.

SANTOS, Waldemar. Perfil de Ana Jansen. São Luís: Sioge, 1978.

VIVEIROS, Jerônimo de. A Rainha do Maranhão. São Luís: Departamento de Cultura do Estado, 1965.

Todos os direitos reservados ao autor João Dias Rezende Filho.

*JOÃO DIAS REZENDE FILHO nasceu em 31 de julho de 1981, em São Luís do Maranhão. Filho do economista João Dias Rezende e da design de moda Rita de Cássia Barbosa Pecegueiro Anchieta. É bacharel em direito pelo Centro Universitário do Maranhão (UNICEUMA), em 2003. Cursou, também, Filosofia. Atualmente, é acadêmico do quarto ano de Teologia pelo Instituto de Estudos Superiores do Maranhão (IESMA) e seminarista da Arquidiocese de São Luís do Maranhão. É membro-conselheiro do Instituto Cultural D. Isabel I a Redentora e seu vice-representante em São Luís. Membro Efetivo da Associação Brasileira de Pesquisadores de História e Genealogia (ASBRAP) sediada em São Paulo. Sócio Colaborador do Colégio Brasileiro de Genealogia (CBG) sediado no Rio de Janeiro. Sócio da Confraria dos Bibliófilos do Brasil sediada em Brasília. Colabora mensalmente na coluna “Você sabia?” com textos de curiosidades sobre a História da Igreja maranhense no “Jornal do Maranhão” da Arquidiocese de São Luís. Publicou alguns artigos em revistas de circulação nacional como “O Comerciante Joaquim Júlio Corrêa” na Revista da ASBRAP nº 16, em 2010 e “Subsídios Genealógicos sobre os Pecegueiros” na Revista da ASBRAP nº 17, em 2011.


http://www.guesaerrante.com.br/2012/9/26/dona-ana-joaquina-jansen-pereira-e-seu-nascimento-3336.htm

Nenhum comentário:

Postar um comentário