quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

basta ,é hora de assumir a responsabilidade.

Assisti, incrédulo, o Maranhão ganhar destaque no noticiário internacional nesta terça-feira, 8.  'Six dead' in Brazil prison riot, noticiou a BBC de Londres. A reportagem exibida para todo o mundo mostrou mais uma rebelião em presídio do Maranhão. Desta vez a revolta foi na cidade de Pinheiro, que resultou em seis presos mortos, dos quais quatro decapitados. Imagens grotescas de cabeças expostas como troféus pelos amotinados também foram veiculadas pelos telejornais locais.    
Há exatos três meses rebelião semelhante explodiu no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, com 18 mortos, dos quais três tiveram as cabeças cortadas. Houve respostas à sociedade? Ampla discussão? Tomada de decisões? Inversão de prioridades na destinação de recursos pelo governo? Mais investimentos no sistema prisional? Se houve, foi em dose homeopática, pois a chaga manteve-se aberta por três meses, e sangrando muito. Deu no que deu. 
Impotência, preocupação, revolta... Não sei definir ao certo o sentimento que me invade em momentos como este. Assistir um repórter de rede mundial noticiar que pessoas sob a tutela do Estado foram executadas sumariamente por colegas que se encontravam na mesma situação, é algo aviltante para qualquer cidadão, principalmente para um magistrado. A chaga do Maranhão foi exposta para o mundo inteiro ver.
Sinto-me na obrigação de cobrar não explicações - pois os motivos todos nós sabemos - mas as devidas providências por parte do Estado.  E não adianta o velho “jogo do empurra”, uma hora culpando o Ministério Público, na outra o Judiciário. “Onde estavam os juízes da Execução e da respectiva Comarca?”, indagam alguns. Outros, ainda complementam: “o juiz tem que acompanhar o preso, então a culpa é do Judiciário”.  
Argumento falho e desprovido de qualquer fundamentação. Vou usar o velho jargão popular: “balela, conversa para boi dormir”. A responsabilidade de estruturar os presídios e delegacias e oferecer condições dignas aos presos como determina a Constituição, visando ao cumprimento da pena, é do Executivo.           
Não foi nenhuma surpresa o que aconteceu no presídio de São Luís em novembro do ano passado, e agora no de Pinheiro. Foi uma tragédia anunciada, pois o Judiciário já havia feito o alerta. A Associação dos Magistrados mostrou em ampla reportagem especial publicada em seu informativo, em abril de 2010, o caos no sistema prisional do Maranhão ocasionado pela superlotação e as providências que estavam sendo tomadas por juízes de várias Comarcas.    
Noticiam-se muitos investimentos do governo no setor de segurança pública, porém apenas para o combate ao crime. Prender, prender e prender é a ordem. Combater a criminalidade a qualquer preço é o foco principal. Mas surge o questionamento: onde prender? Há espaço para tantos presos? Há condições adequadas nestes presídios/ Há  uma efetiva política de ressocialização? A reposta é lógica e sem muito empirismo: Não.  
O resultado inevitável é o crescimento vertiginoso do déficit de vagas nos superlotados estabelecimentos penais, que não têm condição de receber mais presos. E essa realidade não é apenas do Maranhão. Entre 2005 e 2007, a população carcerária masculina cresceu 16,2%. No mesmo período, a população carcerária feminina aumentou 27,52%.

As informações constam do 4.º Relatório Nacional sobre Direitos Humanos, elaborado pelo Núcleo de Estudos da Violência (NEV), integrado por professores e pesquisadores da USP. O NEV é um dos mais antigos e respeitados centros de pesquisa especializados em sociologia criminal da América Latina.

Segundo o estudo, a taxa média de ocupação do sistema prisional passou de 1,4 para 1,8 prisioneiro por vaga, entre 2005 e 2007. Com quase 500 mil pessoas presas, o Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo. Só fica atrás dos Estados Unidos, que têm 2,3 milhões de presos, e da China, com 1,7 milhão. Pelas estimativas do Departamento Penitenciário do Ministério da Justiça, o déficit no sistema prisional brasileiro é de 180 mil vagas. Além disso, há cerca de 500 mil mandados de prisão expedidos pela Justiça que não foram cumpridos.
Diante de uma realidade como essa, não há como tentar transferir responsabilidades. É inaceitável culpar o Judiciário por rebeliões e derramamento de sangue dentro de presídios.
Então, senhores governantes, façam a mea culpa e comecem a agir para mudar este panorama. Caso contrário, muitas outras revoltas sangrentas em presídios brasileiros e do Maranhão serão mostradas em rede mundial. E quem sabe, futuramente, não apenas cabeças extirpadas de seres humanos virão lhes assombrar e tirar-lhes o sono

texto colhido do blog de gervasio santos, juiz de direito.

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