
A luta pela permanência dessas disciplinas no currículo do ensino médio é tão antiga quanto os ataques desferidos contra elas. No período da ditadura militar, aulas de Sociologia e de Filosofia eram consideradas verdadeiros “ninhos de comunistas subversivos”. Muitos professores e seus alunos foram alvos preferenciais de perseguições e ameaças. O cerco foi tal, que essas matérias foram desaparecendo, tanto das escolas públicas quanto das particulares. Resultado: houve uma diminuição da demanda por docentes especializados, atrofia dos cursos de formação e das licenciaturas nessas áreas, assim como uma redução das atividades de pesquisa e de produção de livros e materiais didáticos. Mais recentemente, nos anos 90, auge do pensamento e das práticas ditas neoliberais, as disciplinas voltaram a ficar na mira de medidas de caráter restritivo.
A luta pela permanência dessas disciplinas no currículo do EM é tão antiga quanto os ataques desferidos contra elas
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Evidentemente, esse quadro não se deve à falta que fazem os conhecimentos de Filosofia e de Sociologia na formação dos jovens. Mas a ausência dessas matérias é explicada pelo empobrecimento deliberado das condições de ensino e aprendizagem vigentes no contexto da educação básica brasileira. O descompromisso das elites dominantes, que ao longo da história tomaram decisões sobre a prioridade a ser dada à educação, chega às raias da irresponsabilidade para com o futuro da nação. Se não, vejamos.
Apesar de nosso atraso e das deficiências acumuladas, cuja superação exigiria um empenho maior do que o normal, apenas 3,5% do PIB brasileiro é destinado à educação. Menos que nossos vizinhos como Chile e Argentina. Bem menos do que o investido pelos chamados países ricos (todos investem mais que 5%). Na verdade, em termos de PIB, o esforço direcionado para a educação é simplesmente a metade dos 7% preconizados no Plano Nacional de Educação. O investimento por aluno/ano no ensino médio brasileiro, cuja responsabilidade de oferta pública é dos governos estaduais, é de US$ 1.008,00 enquanto na Alemanha chega- se a US$ 9.835,00. Portanto, dez vezes mais. Argentina, Chile e México, também nesse caso, investem mais que o dobro do Brasil.
Baixos investimentos resultam em precárias condições de acesso e permanência. Enquanto nos Estados Unidos e no Japão 80% dos jovens e adultos já concluíram o nível médio ou mais, no Brasil essa etapa só foi completada por 30% dessa população. E na faixa etária de 15 a 17 anos, apenas 45% estão, de fato, freqüentando o chamado colegial. A maioria está atrasada, não chegou lá ou abandonou os estudos. É o resultado de escolas desestimulantes e de condições econômicas e sociais precárias.
A falta de prioridade, claro, afeta os profissionais da educação. Estudo recente da Câmara de Educação Básica do CNE chega a falar em risco de “apagão do ensino médio” quando constata a escassez de professores para essa etapa. Com um salário em torno de R$ 944,00, professores brasileiros no ensino médio recebem ¼ da remuneração dos seus colegas sulcoreanos e 1/3 dos espanhóis. A conseqüência é que não se consegue atrair jovens para o exercício do magistério. E os poucos que se formam escapam para outro ramo na primeira oportunidade. Não é que faltam professores de Filosofia e de Sociologia para lecionarem nas nossas escolas. São raros, é fato. Mas também não há licenciados suficientes em Física, Química, Matemática, Educação Artística, Inglês etc. E a situação se agrava quando sabemos que 60% dos 2,5 milhões de professores estão mais próximos de sua aposentadoria do que do início da carreira. O quadro é grave, sem dúvida, mas tem solução; e é bom reparar que algumas medidas vêm sendo tomadas, várias delas contidas no recente Plano de Desenvolvimento da Educação, que, entretanto, ainda padece de sustentação financeira adequada.
Uma completa, ampla e sólida formação básica das nossas crianças e jovens a par de políticas que façam do magistério uma alternativa profissional e de vida capaz de atrair os melhores entre os melhores são condições indispensáveis ao desenvolvimento econômico e social do Brasil.
Por tudo isso, não cabem recuos em relação a avanços como a permanência da Filosofia e da Sociologia na formação da nossa juventude, da mesma forma que é preciso agir rápido para assegurar as condições políticas que garantam o conjunto das outras providências necessárias a uma educação de qualidade para todos.
Cesar Callegari é sociólogo, membro do
Conselho Nacional de Educação, presidente do
Instituto Brasileiro de Sociologia Aplicada- IBSA e
Secretário de Educação de Taboão da Serra-SP.
Foi secretário executivo do Ministério da Ciência
e Tecnologia, deputado estadual por dois
mandatos e presidente da fundação para
o Desenvolvimento da Educação
Conselho Nacional de Educação, presidente do
Instituto Brasileiro de Sociologia Aplicada- IBSA e
Secretário de Educação de Taboão da Serra-SP.
Foi secretário executivo do Ministério da Ciência
e Tecnologia, deputado estadual por dois
mandatos e presidente da fundação para
o Desenvolvimento da Educação
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